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Top 10 2018 (ou os meus filmes favoritos de 2018, daqueles que consegui ver)

2018 foi um ano recheado de filmes. Infelizmente, para mim, não foi recheado de filmes recém-estreados. Não obstante, não quero deixar de assinalar alguns títulos marcantes dos últimos dozes meses. Por favor, não se confunda esta lista que apresento por ordem alfabética com o assinalar de “o melhor” seja do que for. É apenas o reflexo da minha cinefilia, dos meus gostos e daquilo que consegui efectivamente ver. Por isso, deixo também no final uma resenha de todos os títulos que gostava de ter visto e (ainda) não vi.

A Balada de Buster Scruggs (The Ballad of Buster Scruggs, Ethan e Joel Coen, 2018)

Uma prova de que o panorama de produção e distribuição cinematográfica está a mudar foi a estreia do mais recente filme dos irmãos Coen no canal Netflix. Filme-mosaico com várias histórias passadas no antigo e selvagem oeste norte-americano, A Balada de Buster Scruggs é um produto inconfundível das sensibilidades de Ethan e Joel Coen. O trágico e o cómico andam de mãos dadas na companhia do prosaico e da violência inusitada, tudo regado com pinceladas de surrealismo, para desenhar um retrato da labuta humana e da evidência das suas fraquezas e defeitos. A não subestimar e a não perder.

 

A Forma da Água (The Shape of Water, Guillermo del Toro, 2017)

Guillermo del Toro revela-se aqui como um incurável romântico, mas continua fiel ao seu afecto pelos «monstros» e pelo outro. Talvez a caracterização das personagens de A Forma da Água seja tão óbvia como as suas referências cinéfilas, e, possivelmente, o sublinhar a grosso da origem da verdadeira monstruosidade no seu centro seja pouco subtil. Mas, num mundo em que tememos o que não entendemos, e numa indústria cinematográfica que tende para a normalização e homogeneidade, é de aplaudir a subversão e a heterogeneidade da aceitação e da tolerância que o realizador mexicano nos propõe. 

 

Aniquilação (Annihilation, Alex Garland, 2018)

Adaptação livre por Alex Garland do romance do mesmo nome por Jeff VanderMeer, Aniquilação demonstra que o romancista tornado argumentista tornado realizador é um dos nomes mais refrescantes no actual panorama da ficção científica no grande-ecrã, oferecendo-nos uma narrativa que destila o espírito desafiante, mutante e assimilador do texto original. Como sempre acontece perante filmes com alguma abstração, cada um poderá projectar os seus preconceitos e ideias no que vê no ecrã, no entanto uma coisa parece ser evidente: o ser humano não é certamente o estágio final dos desígnios misteriosos que a natureza tem reservados para o universo. Infelizmente mais falado do que visto, Aniquilação foi mais uma vítima das antecipações em baixa da sua produtora e acabou por não ter distribuição fora dos EUA nos cinemas, sendo disponibilizado via Netflix.

 

Hereditário (Hereditary, Ari Aster, 2018)

O filme de estreia do argumentista e realizador Ari Aster foi a grande surpresa do ano. Apontado de forma algo redutora como um cruzamento entre Gente Vulgar e O Exorcista, Hereditário é o tipo de filme de terror que contraria de forma refrescante as expectativas dos piores hábitos do género e constrói pacientemente uma narrativa com as doses certas de ambiguidade para o sobrenatural não afogar o verdadeiro horror dos traumas infligidos pelas dinâmicas familiares, especialmente quando estas são tingidas pela tragédia e por ressentimentos recalcados.

 

Homem-Aranha: No Universo Aranha (Spider-Man: Into the Spider-Verse, Bob Persichetti e Peter Ramsey e Rodney Rothman, 2018)

Numa fase de saturação de filmes de super-heróis, e depois de anos de tentativas por parte da Sony para produzir um filme decente baseado no Homem-Aranha, chega-nos uma animação para ensinar o universo de carne-e-osso como se pode abordar um filme deste género com sucesso. Com produção de Christopher Miller e Phil Lord (e uma mãozinha deste último no argumento), na ressaca do despedimento de Solo: A Star Wars Story, Homem-Aranha: No Universo Aranha é um filme inteligente que abraça a diversidade de representação do super-herói (seja na vertente racial, cultural ou mesmo da plataforma pelo qual é veiculado na cultura popular), sabendo olhar com capacidade crítica para si próprio ao mesmo tempo que celebra a sua existência. Tudo isto com uma animação inovadora que foge da (já) tradicional animação por computador e introduz elementos que recriam a sensação dos saudosos livros de quadradinhos.

 

Ilha dos Cães (Isle of Dogs, Wes Anderson, 2018)

Este é sem dúvida o filme menos esperançoso de Anderson, e isso reflecte-se no negrume sugerido pela própria premissa inicial e prolongado pelas opções narrativas do seu autor. Se os mais novos poderão divertir-se com o humor com que vai sendo pincelado, poderão na mesma medida sentir-se oprimidos pelo latente sentimento de violência e miséria. Os mais crescidos encontrarão por certo outros motivos para apreciar esta reflexão sobre individualidade e livre-arbítrio. Nesta viagem de procura literal também se procura decifrar a natureza de cada indivíduo, combatendo-a se necessário. Esta reflexão interior é intrínseca ao cinema de Anderson e à viagem emocional das suas personagens. Como é proferido, a alturas tantas, em Ilha dos Cães: «Temos de pensar em quem somos e em queremos ser.»  

 

Linha Fantasma (Phantom Thread, Paul Thomas Anderson, 2017)

Este é um cinema cerebral e formal, sem óbvias preocupações em invocar reações emocionais. Linha Fantasma está assim mais perto de The Master – O Mentor do que qualquer outro título da carreira de Paul Thomas Anderson. É inegável o rigor formal e a dedicação a uma estética clássica em vias de extinção — tal como Reynolds (Daniel-Day Lewis) perde a cabeça com o rumo do seu ofício, à procura de satisfazer uma necessidade superficial pelo chique, também o realizador parece ter relutância em abandonar um certo classicismo cada vez mais em desuso. 

 

Missão: Impossível – Fallout (Mission: Impossible – Fallout, Christopher McQuarrie, 2018)

Missão: Impossível – Fallout é a rara sequela número seis que tem o potencial de ser o melhor filme da sua série. Nas condições certas de visionamento é um espectáculo contínuo de acção como possivelmente nunca vimos numa tela de cinema até hoje. Na pior das hipóteses, é um excelente entretenimento que não só não envergonha o género em que se insere como define um padrão de exigência e qualidade que os restantes blockbusters norte-americanos só ganhariam em reproduzir.

 

O Interminável (The Endless, Justin Benson e Aaron Moorhead, 2017)

Em O Interminável, debatem-se questões de dinâmicas de poder e do seu enquadramento em estruturas familiares de configurações alternativas. Justin vive com o peso da responsabilidade de salvaguardar a segurança de Aaron, mas este vive sufocado pelas decisões que o irmão toma sem a sua consideração, acabando por encontrar conforto numa comunidade que parece oferecer-lhe aquilo que ele tanto anseia, além de comida e segurança: livre-arbítrio. A ironia é que essa liberdade revela-se estar envenenada num pacto que tem implicações geográficas e temporais. Nesse momento, a questão impõe-se: o que é uma vida infeliz senão uma eternidade de dias sucedendo-se num ciclo aparentemente interminável de repetições e banalidades?

 

Tully (Jason Reitman, 2018)

Entre momentos de verdadeira ansiedade, constrangimento e stress, o optimismo incontornável de Ivan Reitman, atrás das câmaras, e Diablo Cody, responsável pelo argumento, oferecem subtis momentos da mais pura emoção e bondade. Como habitualmente nas histórias de Cody, a conclusão não é definitiva, encontrando antes as personagens um pouco mais sábias do que quando o filme começou. Dependendo do nível de identificação com o que se passa no ecrã, não será de todo descabido que também nós, por entre a vista desfocada e suprimindo a voz embargada, tenhamos aprendido algumas lições de vida.

 

Como prometido, listo também os filmes do ano que gostaria de ter visto, mas (ainda) não vi. Por nenhuma ordem em especial: O Regresso de Mary Poppins, O Primeiro Homem na Lua, A Mulher, Cold War – Guerra Fria, Vendeta, No Coração da Escuridão, Nunca Estiveste Aqui, Anon, Um Lugar Silencioso, Wonderstruck: O Museu das Maravilhas, Lady Bird, Eu, Tonya, Olhares, Lugares, The Post, O Sacrifício de um Cervo Sagrado, Jogo da Alta Roda.

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Written by António Araújo

Cinéfilo, mascara-se de escritor nas horas vagas, para se revelar em noites de lua cheia como apaixonado podcaster.

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