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[MOTEL/X 2017] Santa Sangre

de Alejandro Jodorowsky

muito bom

A presença marcante de Alejandro Jodorowsky no MOTELX de 2017 foi motivo para a exibição de Santa Sangre, um giallo de densidade psicológica e simbolismo visceral.

 

Um dos acontecimentos da 11ª edição do MOTELX foi a presença do inspirador realizador chileno Alejandro Jodorowsky, que nos falou da sua carreira de autor de cinema que divide com a obra de poeta, compositor, dramaturgo, actor, autor de banda desenhada, etc. Essa passagem por Lisboa foi completada com a exibição de dois filmes no festival: El Topo (1970) e Santa Sangre (1989). Falamos aqui de Santa Sangre, aquele que o próprio Jodorowsky considera a sua única incursão no domínio do terror.

Tudo começou num convite de Claudio Argento, irmão e produtor do célebre realizador italiano Dario Argento. Chamado a tentar um filme de crimes violentos, Jodorowsky não estava tão interessado nos clichés das mulheres assassinadas, típico do género giallo, de que os irmãos Argento eram especialistas. Ao invés interessava-lhe analisar a psicologia de assassino, partindo de um ponto de vista muito pessoal, o de que todos têm possibilidade de redenção. E, na boa tradição da sua obra, foi isso que Jodorowsky fez.

Santa Sangre é uma viagem interior, plena de simbolismo e referências freudianas e religiosas, pelo percurso de Fenix (Adan Jodorowsky em criança, Axel Jodorowsky em adulto, ambos filhos do realizador, como também Teo Jodorowsky, no papel do chulo) homem que vemos numa instituição psiquiátrica, de quem testemunhamos retrospectivamente a infância traumatizante, e posteriormente a sua reintegração no mundo, onde exorciza os traumas numa série de homicídios violentos.

Com o referencial circense, a música de rua e o colorido das gentes humildes em primeiro plano, Santa Sangre conta a história de Fenix, criança, que testemunha o crime passional que envolve a morte de seu pai (Guy Stockwell) depois de decepar os braços de sua mãe, Concha (Blanca Guerra), à imagem da Santa Sangre, uma mártir sexual adorada por um culto de fiéis, que se baptizam numa piscina de sangue sagrado.

A partir daí, o vermelho do crime, sangue, paixão, luxúria, desejo, contrastará com o branco virginal, a cor de Alma (Faviola Elenka Tapia em criança, Sabrina Dennison em adulta), a amada de Fenix), que é a cor com que Fenix pinta as suas vítimas, objecto de desejo reprimido. O contraste é também o do desejo de Fenix, e da repressão de Concha, que usa (literalmente) as mãos do filho como as suas para executar quem o afaste de si, numa eterna vingança do crime cometido pelo esposo anos antes.

Além da crueza da sangrenta violência explícita, e de uma narrativa estilizada em imagens que passam por uma mímica de sequências sem palavras (a mímica sempre a desempenhar um papel fundamental em Jodorowsky), o que mais impressiona em Santa Sangre é todo o décor, detalhadamente tratado, fazendo de cada espaço cenário de um sonho tortuoso, numa atmosfera onírica onde trauma de infância, passagem pelo hospício, presença surreal da mãe, gestos loucos do protagonista e simbolismos freudianos concorrem para toda uma irrealidade de pesadelo que colocam a história algures entre sonho e realidade.

Mais visceral que racional, Santa Sangre, como sempre em Jodorowsky, é um explorar de sensações e emoções numa busca directa do que mais profundo pode haver na alma do seu protagonista, onde episódios, violência, grotesco e referências laterais (o circo, a música, as artes performativas, o sexo, o desejo) são motivações que Jodorowsky trata com todo o seu simbolismo poético e associação quase livre típica do surrealismo.

Então, como agora, mais que pelo lado de terror, no qual a narrativa baseia a sua matriz, Santa Sangre é uma experiência sensorial plena de originalidade, que não deixa ninguém indiferente.

Review overview

Summary

Experiência sensorial plena de surrealismo e simbolismo (freudiano, sexual, religioso), Santa Sangre é um exemplo do mundo onírico de Jodorowsky, que numa associação livre de imagens e ideias, nos conduz por uma tortuosa narrativa criminal, vestida de momentos, cores e cenários únicos.

Ratings in depth

  • Argumento
  • Interpretação
  • Produção
  • Realização
3.5 10 muito bom

Comentários