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[MOTEL/X 2017] Cult of Chucky

de Don Mancini

mau

Chucky, o diabólico boneco assassino, pode não gozar da popularidade de outros títulos do género de terror, mas é um raro sobrevivente da década de oitenta.

 

Chucky, o diabólico boneco assassino, pode não gozar da popularidade de outros títulos do género de terror, mas é um raro sobrevivente da década de oitenta e, quando muitos títulos populares da altura já desapareceram ou foram alvos de remakes e reboots, continua a subsistir graças a um persistente culto, passe a piada.

Tudo começou com o sucesso de bilheteira de Chucky, o Boneco Diabólico (Child’s Play, no original), realizado em 1988 por Tom Holland com base num argumento do próprio em colaboração com John Lafia e Don Mancini, o cérebro por trás do conceito original. A premissa era interessante: colocar um boneco de criança benigno como o agente de morte e destruição num violento filme de terror. A narrativa era pouco importante e a “transferência” da alma do criminoso interpretado pelo lendário Brad Dourif acontecia imediatamente no decorrer do genérico inicial. Estava lançado o fenómeno.

Logo passados dois anos, Lafia salta para a cadeira de realizador de uma sequela que emulava a papel químico a fórmula do filme original, novamente escrito por Don Mancini, que nunca mais largaria o papel de argumentista da saga. Chucky, o Boneco Diabólico 2 (Child’s Play 2, 1990), tem alguns motivos de interesse, nomeadamente o facto de contar com a musa dos anos setenta Jenny Agutter. Ainda assim é um filme menor que o anterior, tal como seria um ano depois Chucky, o Boneco Diabólico 3 (Child’s Play 3, 1991) que, apesar de fazer crescer a sua personagem principal enviando-o para uma academia militar, esgotava a fórmula ao fim de duas sequelas.

Quando a saga é retomada em 1998, Gritos (Scream) de Wes Craven tinha revitalizado o género virando-o de pernas para o ar com o seu comentário metafísico ao próprio cinema de terror. A Noiva de Chucky (Bride of Chucky), realizado por Ronny Yu — futuro realizador do desnecessário mas descabelado e divertido Freddy Contra Jason cinco anos mais tarde — é um produto desta nova vida que o terror ganhou na segunda metade da década de noventa. Além de trazer para grande plano o humor que era usado parcimoniosamente pelo boneco, introduz uma nova “personagem” que marcaria o futuro da saga: Jennifer Tilly.

Esta veia irónica e cómica só seria retomada seis anos mais tarde em A Semente de Chucky (Seed of Chucky, 2004) pela mão do próprio argumentista Don Mancini. Contando com John Waters num pequeno papel e com Jennifer Tilly interpretando uma versão exagerada de si própria num cenário de filme dentro de filme — ainda heranças da saga Gritos —, esta é, no entanto, a pior entrada da saga. Apesar do aumento dos níveis de violência, a tentativa de humor é um tiro completo ao lado, levando novamente o boneco e companhia para um beco sem saída.

Em 2013, nove anos depois do filme anterior, Don Mancini opera com A Maldição de Chucky (Curse of Chucky) um soft reboot produzido directamente para o mercado de vídeo nos EUA e o resultado é, provavelmente, o melhor filme da série. Abdicando quase totalmente do humor, à excepção de algumas linhas de diálogo do próprio Chucky, Mancini constrói um filme no formato clássico de casa assombrada que introduz uma nova heroína, a paraplégica Nica — curiosamente interpretada pela filha de Brad Dourif, Fiona — e, ao mostrar contenção e paciência na revelação da real faceta do boneco, constrói um competente filme de suspense onde o seu ponto mais fraco é mesmo a necessidade de oferecer uma continuidade forçada com o resto dos filmes. Entretanto, numa cena após os créditos, promete novas aventuras com o retornado personagem Andy Barclay, interpretado novamente por Alex Vincent, o actor-criança que vestiu o papel nos dois primeiros filmes.

Chegados a 2017, tivemos a oportunidade de ver Cult of Chucky no MOTELX, antes do seu lançamento e depois da sua estreia mundial em Agosto deste ano no festival FrightFest em Inglaterra. Nica passou os últimos quatro anos numa instituição mental por crimes que não cometeu. O seu psiquiatra dá-lhe um boneco Good Guy como uma ferramenta terapêutica, mas rapidamente surge uma nova série de assassinatos no asilo onde se encontra. Entretanto, o velho inimigo de Chucky, Andy Barclay, dirige-se ao hospital com o objectivo de ajudar Nica.

Novamente realizado pelo perene Mancini, Cult of Chucky é, no entanto, um passo atrás em relação ao filme anterior. Definitivamente mais violento e cruel que qualquer capítulo anterior, volta a suportar-se do humor — que tem alguma graça, em abono da verdade — para disfarçar um argumento bastante fraco. Curiosamente, ao mesmo tempo que tenta fazer algo diferente, demostra alguma dificuldade em trazer à série algo de novo. Além de emular, a alturas tantas, os split screens de Brian de Palma — inovadores na década de setenta —, recicla (pelo menos) uma cena de morte envolvendo estilhaços de vidro e a lei da gravidade já visto há dezanove anos atrás em A Noiva de Chucky. Aliás, este deve ter sido um filme presente na mente do autor visto que recuperou brevemente a personagem da boneca de Tiffany com a promessa muito contemporânea de uma sequela ainda antes deste filme acabar. Ah! E a utilização de Andy Barclay nesta narrativa? Um desperdício inexplicável num conjunto de cenas completamente inúteis.

O futuro do cinema de terror não passa por aqui, mas Don Mancini parece ter encontrado o seu nicho e não demonstra vontade de sair de lá. Esperemos que o próximo capítulo encontre um maior equilíbrio entre o terror mais puro e a inescapável vontade de fazer humor.

Review overview

Summary

O futuro do cinema de terror não passa por aqui, mas Don Mancini parece ter encontrado o seu nicho e não demonstra vontade de sair de lá. Esperemos que o próximo capítulo encontre um maior equilíbrio entre o terror mais puro e a inescapável vontade de fazer humor.

Ratings in depth

  • Argumento
  • Interpretação
  • Produção
  • Realização
2 10 mau

Comentários

Written by António Araújo

Cinéfilo, mascara-se de escritor nas horas vagas, para se revelar em noites de lua cheia como apaixonado podcaster.

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