Na sua estreia em longas-metragens Daniel Goldhaber traz-nos um olhar para o mundo das cam girls e das salas virtuais de shows eróticos.
Cam é uma pequena aventura cinematográfica, escrita por Isa Mazzei e realizada por Daniel Goldhaber, o qual se estreia na realização de longas-metragens. Talvez pela juventude do autor, o tema de Cam é algo bastante actual, e muito pouco abordado (pelo menos com seriedade) no cinema: o mundo das profissionais de shows eróticos na internet.
Vindo da mente de uma profissional desse submundo (Isa Mazzei foi, durante muito tempo, uma cam girl), Cam nasceu depois de Mazzei contratar Goldhaber para fazer alguns filmes promocionais para a sua actividade na internet. Os dois pensaram então dar o passo seguinte, construindo uma ficção sobre esse mundo, que todos sabemos que existe, mas fingimos sempre fica num canto longínquo que não faz parte do nosso.
E esse é o principal trunfo de Cam. Com a interpretação de Madeline Brewer, no papel da cam girl Alice (de nome artístico Lola), o filme leva-nos ao mundo das salas de chat privadas pré-pagas, das bitcoins, da conversa de sexo, das relações virtuais, e desse faz de conta que é vestir uma persona pública da parte de alguém que, por mais liberal e aberta que seja, quer manter alguma privacidade e não se ver julgada na sua vizinhança por aquilo que faz na internet.
E é aí que começa o terror da história, quando Alice/Lola – que vive numa luta constante para subir no ranking e superar as suas concorrentes – sente perder o controlo do seu mundo, primeiro quando pessoas «virtuais» surgem onde ela mora, depois ao perder acesso à sua conta no serviço online que usa, e, finalmente, quando a pessoa que usurpa a sua conta (uma perfeita doppleganger, idêntica em tudo) passa a fazer shows públicos, que toda a gente que a conhece pode ver.
O terror, aqui, vem desse roubo de identidade e perda de controlo da privacidade, que são também críticas à sociedade moderna, onde a nossa presença virtual, feita de exibicionismo, fronteiras ténues entre público e privado, e uma enorme necessidade de mostrar uma persona fictícia, podem transformar comportamentos e condicionar vidas.
Filmado como se estivéssemos quase continuamente a ver um show de webcam, Cam traz-nos esse esbater de fronteiras, com um olhar directo e frontal para uma pessoa que tanto nos pode parecer real como virtual, e é aí que a tal existência da doppleganger funciona tanto como mistério (insolúvel no filme) como metáfora de separação esquizofrénica de identidades.
Fica a ideia de que um conceito tão conciso e limitado dava uma boa curta-metragem ou episódio televisivo (Black Mirror vem-nos de imediato à memória), e se esfuma ao tentar uma longa-metragem que cedo perde o seu sumo e fôlego. Para além do mistério (de facto irrelevante) sobre quem é a doppleganger, e da interpretação convincente de Brewer, destaca-se o final sangrento, ele próprio de um gore perturbador, e inesperado, num filme que tem como principal mérito abordar um tema que ainda vai parecendo tabu nos nossos dias.
Review overview
Summary
Cam é um olhar para as salas privadas pré-pagas de chat onde ocorrem shows eróticos, visto pelos olhos de uma cam girl, em luta para manter a privacidade e identidade, num episódio algo surreal envolvendo uma doppleganger.
Ratings in depth
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Argumento
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Interpretação
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Produção
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Realização