Mamoru Hosoda é já um nome recorrente de edições anteriores da Monstra, e um dos realizadores japoneses mais conceituados da actualidade. Em 2018 o festival dedicou-lhe uma retrospectiva integral, e no início de 2019 foi um dos nomeados para o Oscar de Melhor Filme de Animação com este Mirai – filme que pega em temas semelhantes a alguns dos seus projectos anteriores, mas que lhes dá um novo toque – familiar e humano.
Há muitas viagens no tempo, saltos constantes entre o passado distante e o futuro mais próximo, com um cão que fala e ganha formas humanas só quando Kun, o protagonista (o irmão da recém-nascida Mirai) está a ver. A entrada da irmãzinha na famíla vai perturbar o status do pequeno rapaz: vai deixar de ser o centro das atenções, tal como o seu cão deixara de o ser assim que ele nasceu. E a partir desta premissa, Hosoda propõe-nos um belíssimo conto sobre as decisões que tomamos na vida – e a maneira como nos poderemos arrepender (ou não) delas quando já for tarde demais.
Sim, o material promocional de Mirai não nos dá muito a indicação da presença destas temáticas mais filosóficas na sua narrativa, mas é delas que faz a sua maior força. Começamos com momentos de hilariantes gags na casa da família de Kun: o pai que fica a trabalhar em casa e a tratar dos filhos, o cão e os seus problemas existenciais, a pequena Mirai e os seus primeiros dias de vida, e Kun com as suas brincadeiras e uma imaginação carregada até ao limite. Mas quando o filme muda de direcção e, na sua estrutura episódica, nos leva a descobrir os antepassados de Kun e o seu futuro e o da irmã (não só em viagens espacio-temporais, mas também com a visita da irmã, já jovem, ao presente da história), começamos a compreender as várias camadas que Hosoda inseriu a esta personagem, a este singelo garoto que só quer brincar com comboios.
A comédia e o sentimentalismo são misturados em doses justas e equilibradas, com um timing perfeito para que o espectador consiga seguir toda a teia de antepassados e pessoas futuras que Kun visita. A criança aprenderá uma lição importante que é, também, essencial para os espectadores: que todos os nossos actos foram condicionados pelo que os que vieram antes de nós fizeram, e serão importantes para condicionar o futuro dos que se seguirão a nós. E que, acima de tudo, é preciso aproveitar a vida – mesmo que a melhor altura para o fazer (a infância e juventude) seja aquela a que menos damos importância ao quão valiosa a vida é.
Mirai é então um filme surpreendente que conjuga diversas dimensões temporais com um propósito profundo e moral. Poderá não ser o trabalho mais vistoso ou aclamado de Hosoda fora dos prémios da Academia, mas é sem dúvida mais um exemplo da brilhante forma como o realizador sabe conjugar o fantástico com uma dimensão humana memorável, conjugando animação 2D e 3D para nos levar a caminhos que nos podem fazer sorrir, ou que nos façam sentir um estranho arrepio na espinha.
Review overview
Summary
Mirai é mais um triunfo de Mamoru Hosoda, num filme que mistura viagens no tempo com as aventuras de um rapaz e da sua irmã recém-nascida.
Ratings in depth
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Argumento
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Interpretação
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Produção
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Realização