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Missão: Impossível – Fallout

de Christopher McQuarrie

muito bom

Tom Cruise e Christopher McQuarrie voltam a formar equipa para mais uma Missão: Impossível em que tentam reproduzir o sucesso do capítulo anterior.

 

Quando, em 1996, Brian De Palma realizou a adaptação ao cinema da popular série televisiva Missão Impossível com Tom Cruise no principal papel, ninguém poderia adivinhar a longevidade e qualidade da saga que se construiria a partir daí, ao longo de quase vinte anos. Naquele que foi o primeiro projecto da recém-criada produtora de Tom Cruise, Brian De Palma realizou um thriller de espionagem que pegou na natureza episódica da série original para a desconstruir — não sem alguma polémica —, baralhando as cartas e mudando as regras do jogo. O que antes era o trabalho para uma equipa passou a ser a missão de um homem só — Ethan Hunt — figura central à volta do qual gravitariam em aventuras seguintes diferentes personagens em variadas configurações de equipas. 

Christopher McQuarrie aceitou o convite de Tom Cruise para ser o timoneiro do quinto capítulo de Missão Impossível enquanto filmavam Jack Reacher, o excelente filme de acção de 2012. Além desta colaboração, os dois haviam trabalhado no passado em filmes escritos por McQuarrie, incluindo uma re-escrita não creditada em Missão Impossível: Operação Fantasma (2011), experiência que terá contribuído para o voto de confiança dado por Cruise ao realizador para orientar o destino da sua bem curada saga. Em 2015, Jason Bourne estava temporariamente fora de serviço e James Bond, depois do sucesso de Skyfall, parecia disposto a recuperar o ceptro no que respeita a filmes de acção e espionagem de travo internacional. Só que o agente britânico haveria de perder a corrida: não só Spectre foi um desastre como foi antecipado na data de estreia e ultrapassado em emoção e adrenalina por Missão Impossível: Nação Secreta, com o qual partilhava uma narrativa muito semelhante.

Nitidamente, Tom Cruise ficou tão satisfeito com o trabalho de Christopher McQuarrie em Missão Impossível: Nação Secreta que quebrou o molde que caracterizava a série — convidar sempre um novo realizador a cada capítulo — e convidou o argumentista e realizador para levar a bom porto Missão: Impossível – Fallout (2018), a sexta entrada da saga que não pára de surpreender e crescer em popularidade. Além disso, se tem havido sempre o cuidado de recuperar aqui e ali pormenores de narrativas anteriores, nunca antes tinha um filme servido como uma continuação directa aos acontecimento do capítulo anterior, lidando directamente com as suas consequências.

Após a captura do criminoso Solomon Lane (Sean Harris), o Sindicato reagrupou-se num grupo terrorista conhecido como Os Apóstolos. Quando este grupo fica na posse de três núcleos de plutónio por causa de uma decisão de Ethan Hunt (Tom Cruise), este reune os seus colaboradores habituais Benji (Simon Pegg) e Luther (Ving Rhames) numa tentativa de os recuperar. Apesar das objecções do Secretário do IMF Alan Hunley (Alec Baldwin), a directora da CIA Erica Sloane (Angela Bassett) ordena que o agente August Walker (Henry Cavill) acompanhe a missão cujo ponto de partida é um encontro com a negociante de armas conhecida como Viúva Branca (Vanessa Kirby). Para complicar as coisas, Hunt cruza-se com Ilsa Faust (Rebecca Ferguson), e ambos percebem ter novamente objectivos incompatíveis entre si.

A narrativa excessivamente complicada de Missão: Impossível – Fallout não distrai, no entanto, daquilo que realmente importa. Este é provavelmente o capítulo mais ambicioso da série, elevando a fasquia do filme anterior e conseguindo a proeza de a superar com distinção. Especialmente no formato IMAX 3D — há pelo menos duas cenas inacreditáveis filmadas em câmaras digitais de alta resolução formatadas para IMAX —, este é um modelo de cinema-espectáculo a que muitos blockbusters norte-americanos se propõem e que poucos conseguem cumprir. Mais uma vez, o elemento essencial para este resultado é o realismo que a destreza da sua estrela empresta ao empreendimento, fazendo questão de se superar no que respeita aos desafios físicos que abraça e que executa quase na íntegra em frente às câmaras que curiosamente, nesta produção, exceptuando os casos referidos, filmaram no táctil e persistente formato de película de 35mm. Sem querer estragar muito a quem não viu — não revelarei nada que não seja mostrado nos trailers promocionais do filme —, é digno de nota que, sem nos apercebermos das costuras, assistimos Tom Cruise a efectuar um salto HALO (High Altitude Low Opening), a conduzir carros e motos a uma velocidade vertiginosa pelo meio de trânsito em sentido contrário, pendurado de um helicóptero e a correr desenfreadamente. Muito. Mesmo. E durante muito tempo.

De volta ao elenco estão também os veteranos Simon Pegg e Ving Rhames. Repetindo a presença no anterior, encontramos Sean Harris, o primeiro vilão a fazer a dobradinha, Alec Baldwin, passando de antagonista a membro da equipa, e Rebecca Ferguson, a grande revelação de Missão Impossível: Nação Secreta, aqui com um papel mais reduzido, o que, apesar de se lamentar, compreende-se pela gravidez da actriz durante a rodagem. A estrear, encontramos a sempre fiável Angela Bassett, a jovem Vanessa Kirby, e Henry Cavill que, ultrapassando o infame bigode que arruinou as refilmagens de Liga da Justiça, é convincente como o infame agente cujos métodos são como um “martelo”, por oposição ao “bisturi” Ethan Hunt. Curiosamente, ao fim de dois filmes, Jeremy Renner ficou de fora sem que a sua personagem seja sequer referida.

Christopher McQuarrie volta a revelar-se como um conhecedor profundo daquilo que funciona na saga e, ainda antes do habitual genérico inicial em que podemos ter um vislumbre do que se vai seguir, o prólogo oferece imediatamente todos os ingredientes que irão certamente agradar aos fãs mais acérrimos, tanto da actual versão cinematográfica, como da original série televisiva. Durante a restante narrativa, não obstante a impenetrável trama, somos brindados com referências a praticamente todos os episódios anteriores que recompensarão os mais atentos: tanto elementos de pormenor — como uma ligação directa à personagem Max do filme inaugural de Brian De Palma ou uma cena reminescente da sequência inicial da sequela de John Woo — como elementos mais relevantes do passado pessoal de Ethan Hunt que o colocam numa situação de conflito interno em que tenta lidar com as consequências das suas acções passadas, o que lhe proporciona um inesperado arco emocional.

Este é também talvez o capítulo mais negro da saga, com uma brutalidade inusitada nos combates corpo-a-corpo e momentos de violência bem encenados por McQuarrie que nos fazem duvidar da consistência dramática da caracterização de Ethan Hunt para mais tarde nos serem revelados como golpes de magia dos quais fomos momentaneamente vítimas. Tal como os membros da equipa IMF, também McQuarrie se diverte a iludir-nos e a surpreender-nos de forma a intensificar a tensão das cenas, como por exemplo, no pormenor de grande eficácia estética e dramática que envolve o afundamento de uma viatura celular. Se o arranque do filme depende das habituais e incontornáveis cenas de exposição narrativa, a partir daí somos envolvidos num crescendo de acção imparável que culmina num final vibrante auxiliado pela propulsiva banda sonora de Lorne Balfe — que substituiu Joe Kramer, compositor em Missão Impossível: Nação Secreta —, nitidamente a colher frutos da influência da música recente de Hans Zimmer.

Missão: Impossível – Fallout é a rara sequela número seis que tem o potencial de ser o melhor filme da sua série. Nas condições certas de visionamento é um espectáculo contínuo de acção como possivelmente nunca vimos numa tela de cinema até hoje. Na pior das hipóteses, é um excelente entretenimento que não só não envergonha o género em que se insere como define um padrão de exigência e qualidade que os restantes blockbusters norte-americanos só ganhariam em reproduzir.

Review overview

Summary

Nas condições certas de visionamento, Missão: Impossível - Fallout é um espectáculo contínuo de acção como possivelmente nunca vimos numa tela de cinema até hoje. Na pior das hipóteses, é um excelente entretenimento que não só não envergonha o género em que se insere como define um padrão de exigência e qualidade que os restantes blockbusters norte-americanos só ganhariam em reproduzir.

Ratings in depth

  • Argumento
  • Interpretação
  • Produção
  • Realização
4 10 muito bom

Comentários

Written by António Araújo

Cinéfilo, mascara-se de escritor nas horas vagas, para se revelar em noites de lua cheia como apaixonado podcaster.

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