É de conhecimento geral que a grande problemática de filmes que se apoiam em questões de body image e/ou distúrbios alimentares reside na proximidade com que se encontram da propaganda barata ou do anúncio publicitário, ao invés de se debruçarem nas lutas humanas instaladas no seu íntimo. E a estreia direccional de Sanna Lenken, A Irmã Mais Nova, embora que emane o potencial de uma abordagem humana e refrescante, raramente satisfaz a promessa de coordenação sensorial e narrativa que o cinema originado da Escandinávia tipicamente garante.
À beira da adolescência, Stella, a irmã precoce e naturalmente robusta de Katja, uma patinadora de gelo de competição, vive entre a idolatração e inveja (maioritariamente pela atenção roubada pelos pais) da sua irmã, e a adoração sexual pelo treinador alemão da mesma sobre o qual escreve poemas eróticos no seu diário. Katja é empenhada, treina horas a fio e mantém uma dieta equilibrada. Secalhar até demasiado equilibrada. E Stella vive entre ela mesma e uma versão de Katja que ela gostava de adoptar. Até que uma noite Stella apercebe-se de que algo de errado se passa com a irmã e a partir daí, um labirinto de manipulação e mentira é desencadeado, um que perdurará para a definição da pessoa na qual Stella se desenvolverá.
Vencedor de um Urso de Cristal para Melhor Filme na categoria da Generation KPlus no Berlinale em 2015 e do Prémio do Público para Melhor Filme Nórdico no Festival de Cinema de Göteborg na Suécia também no ano passado, a co-produção sueca e alemã em muito empresta das dificuldades e frustrações pessoais de Lenken, esta que sofreu de anorexia enquanto adolescente, e já o tinha feito antes com a sua curta-metragem Eating Lunch (2013). Assim, dando uso a este tema universal e sempre pertinente, A Irmã Mais Nova debruça-se sobre a relação entre duas irmãs, o amor que as une e a doença mental que eventualmente as separa. Através dos olhos de Stella e na sua cara sardenta é registado cada movimento suspeito, cada olhar augustiante e, a um determinado momento do filme, quando iluminada por uma vela vulcão, é nela encontrada a confirmação do que o distúrbio de Katja trará à sua vida. E essa mudança, repleta de adultos intimidantes e adolescentes deflectores, torna-se a tese do filme de Lenken.
Como tal, seria de esperar que o filme se elevar-se-ia, eventualmente, a um nível social para assim iniciar uma conversa sobre os ideais inatingíveis que a sociedade de hoje coloca sobre as raparigas jovens e de quão derrotador isso é, mas a verdade é que nunca realmente o faz. E mesmo sendo claro que a compaixão que move o processo de crescimento das irmãs e a descoberta da talentosa Rebecka Josephson, por sinal a neta de 11 anos de Erland Josephson (Fanny e Alexander, Lágrimas e Suspiros), pedia muito mais do que uma encenação do ritmo orgânico do dia-a-dia, no final tudo o que Lenken tem para nos oferecer é o condicionamento da sensibilidade dos seus personagens.
Semelhante em ritmo aos eternos coming-of-age de Lukas Moodysson e conceptualmente próximo de À Ma Soeur! de Catherine Breillat, também a câmara de Moritz Schultheiss (Tore tanzt) vive das feições das duas jovens actrizes, Rebecka Josephson e Amy Diamond, e move-se conturbada à sua volta depositando toda a sua fé nelas. Os fatos de patinagem reluzentes, os olhos escuros de Josephson quando em contraste com a vulnerabilidade do seu cabelo ruivo e da pele de alabastro, a sequência de bicicleta num pano de fundo de luzes nocturnas ou as várias manifestações de ira de Stella só servem para aumentar a frustração do espectador.
Porque sim, é notável quão Lenken se esforça para acrescentar a emoção subliminar do adolescente e o seu sofrimento inerente no ecrã, mas esta esquece-se que a vida que todos vivemos quando projectada sem grandes artifícios narrativos irá, na maior parte das vezes, assemelhar-se a uma telenovela ou a um drama recorrente da Lifetime. E no meio de labirintos de afeção e retração que surgem com demasiada facilidade e dessa mesma forma são retirados, a complexidade das perguntas evapora-se deixando apenas uma nuvem de indiferença a pairar no ar.
Review overview
Summary
A Irmã Mais Nova tenta articular as suas intenções, mas aquilo que promete mostrar transforma-se num drama da Lifetime que não consegue controlar as suas ideias padrão, acabando por se perder numa linha de história demasiado melodramática para o seu bem. A performance de Rebecka Josephson, no entanto, continuará a atribuir ao filme um lugar de destaque que este nem sempre faz por merecer.
Ratings in depth
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Argumento
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Interpretação
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Produção
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Realização